PORQUE LI?
Depois de ter fotografado a Aida a ler nos jardins do Palácio de Cristal, decidi finalmente visitar a Confraria Vermelha, a livraria-sonho que a Aida tornou realidade em Outubro de 2015. Falei-lhe da minha intenção de ler mais literatura escrita por mulheres e decidi investir num livro. Quis que fosse de ficção e curto, porque na altura (isto passou-se em Julho) andava ocupada com um curso e projectos profissionais que me obrigavam a outras leituras. “O Amor”, de Marguerite Duras, pareceu-me perfeito: são 73 páginas de um romance sobre o qual nada sabia, mas que imaginava tão bom quanto “O Amante”, que é um dos livros da minha vida.
O QUE ACHEI?
Diz a Editorial Presença, na sinopse que está na contracapa do livro, que “O Amor” é um dos textos mais enigmáticos e fascinantes de Marguerite Duras. Enigmático é, sem dúvida. Fascinante, já acho discutível… Não gostei do que li e demorei quinze dias a consumir as 73 páginas que dão corpo a um romance delirante composto por frases telegráficas.
“Dia. O homem caminha de novo à beira-mar. Ela está lá outra vez, apoiada no muro. A luz é intensa. A mulher está inerte e de lábios cerrados. Pálida. Na praia, um certo movimento.“
Não me é fácil escrever sobre o que vou lendo. Este livro, contudo, leva essa dificuldade a outros níveis. Talvez começar pelo que me pareceu mais concreto ou palpável me ajude a organizar o discurso…
Um bom ponto de partida é o lugar onde decorre a acção. Chama-se S. Thala, fica junto à foz de um rio e, logo, junto ao mar. Nessa foz do rio forma-se uma ilha e nessa ilha ergue-se um edifício. Perto da ilha e junto ao mar há um hotel. Em S. Thala há uma fábrica. Há, também, um edifício governamental, uma praça, uma avenida muito grande e direita, e casa brancas com terraços. Este lugar é, para mim, o único ponto luminoso do livro: porque está perto do mar, porque há uma praia, porque faz sol e calor a maior parte do tempo, porque há gaivotas e porque as casas são brancas. Tudo o resto, no texto de Marguerite Duras é, no meu entender, obscuro.
Os personagens principais são três: dois homens e uma mulher. Nenhum tem nome. Passam o seu tempo a vaguear entre o hotel, o edifício na ilha e S. Thala. Também passam muito tempo a caminhar na praia ou estendidos no areal, onde mantêm conversas ambíguas nunca a três, sempre aos pares: os homens entre si e um dos homens com a mulher.
Uma vez que pouco mais do que isto é explicado de forma objectiva, a imaginação divaga. Na minha cabeça S. Thala fica na Normandia, a acção decorre a seguir à Segunda Guerra Mundial (embora, por vezes, também decorresse num cenário pós-apocalíptico num futuro longínquo), a fábrica é uma central nuclear, o edifício na ilha é uma prisão, o hotel está à beira da falência, há um triângulo amoroso entre os três personagens principais, um segredo terrível, filhos abandonados em circunstâncias extremas, mulheres desprezadas e falta de liberdade. Decidi que a principal protagonista da história enlouqueceu. Aliás, decidi que todos os protagonistas da história perderam o uso da razão.
Seria esse o objectivo de Marguerite Duras, que percebêssemos o amor como uma forma de loucura, um fruto da imaginação, um fenómeno obscuro que nos aliena, faz perder a noção do tempo e do espaço e nos enreda em segredos e diálogos desconexos?
Seja como for, não me quero demorar muito mais a escrever sobre “O Amor”. A memória da leitura não me traz uma boa sensação. Aliás, irrita-me. Tal como me irrita o texto que agora escrevo. Julgo que ainda não digeri a desilusão. Tinha as expectativas elevadas pela beleza poética e transgressora d’ “O Amante”. Talvez não tenha lido “O Amor” na melhor altura. Talvez não esteja preparada para entendê-lo. Talvez nunca venha a estar preparada. Paciência.