Já li – Silêncio na era do ruído

Sandra Barão Nobre - Acordo Fotográfico - Silêncio na Era do Ruído - Erling Kagge

PORQUE LI?

Andei a “namorar” este livro desde finais do ano passado, quando o vi em destaque na livraria Almedina do Saldanha, em Lisboa. Na altura, apesar do fascínio pelo tema e apesar de outras leituras me encaminharem claramente para este livro, refreei o impulso de comprá-lo. Em Julho deste ano, porém, ao fazer o Caminho de Santiago, um episódio de silêncio — interior? exterior? — e a sua surpreendente quebra levou-me o pensamento até ao livro de Erling Kagge. Comprei-o assim que voltei a casa. Li-o numa manhã.

O QUE ACHEI?

O silêncio é sobretudo uma ideia. Uma noção. O silêncio que nos rodeia pode conter muito, mas o tipo de silêncio mais interessante é o interior. Um silêncio que cada um de nós tem de criar. É por isso que já deixei de tentar criar um silêncio absoluto à minha roda. O silêncio que procuro é o interior.” (Pág. 35)

Erling Kagge é um homem fascinante, de quem nunca tinha ouvido falar. Nascido em 1963, deixou de exercer na área do Direito para estudar Filosofia, fundou em 1996 uma das maiores editoras norueguesas da atualidade, coleciona arte, nomeadamente ícones russos, e é um explorador intrépido — foi a primeira pessoa a ter chegado aos “três polos”: o Polo Norte (1990), o Polo Sul (1993) e o Monte Evereste (1994).

Enquanto que a aventura até ao Polo Norte foi vivida na companhia de Børge Ousland, também ele explorador, fotógrafo e escritor, o caminho até ao Polo Sul foi feito sozinho. Erling Kagge caminhou 1310 km sem qualquer forma de contacto com o resto do mundo, arrastando, pé ante pé, durante 50 dias, todo o seu equipamento colocado sobre um trenó. Ao longo desse período não viu um único ser vivo e nunca abriu a boca para falar. Foi esta experiência avassaladora — a par de outras que têm em comum a natureza e o movimento, quer seja a caminhar ou a velejar — que levou Kagge a aperceber-se da sua necessidade primordial de silêncio e quanto mais refletia sobre isso mais se sentava para escrever sobre o assunto.

Assim surgiram os 33 pequenos textos que compõem o maravilhoso livro “Silêncio na era do ruído”, onde Kagge revela não só os seus pontos de vista, mas também o que resultou de conversas com a família, amigos, estudantes, atletas e tantas outras pessoas sobre o que é o silêncio, o que significa, como e onde o encontramos; textos que refletem as inúmeras leituras que fez, de tantos temas distintos, mas que de alguma forma tocam o tema do silêncio; textos que abordam, inevitavelmente, os desafios dos tempos modernos, que exigem estarmos sempre conectados, na ânsia de não perdermos pitada do que se passa no mundo, e do impacto dessa atitude no nosso corpo e na nossa mente; textos que não deixam de fora a neurociência e algumas experiências interessantes relacionada com o silêncio; enfim, textos que espelham uma personalidade fora do comum, um intelecto riquíssimo, um grau de maturidade, sabedoria e sageza que a maioria de nós nunca alcançará.

(…) eu diria que o silêncio é um método prático para descobrir respostas ao intrigante quebra-cabeças que somos nós mesmos, e para ajudar a adquirir uma nova perspetiva sobre seja o que for que possa estar escondido para lá do horizonte.” (Pág. 117)

Silêncio na era do ruído” é um livro completo, que viaja da Filosofia às Ciências Exatas, dos oceanos às calotas polares, dos esgotos de Nova Iorque às florestas, do zen à tecnologia de ponta, do surf à música, do ancestral ao contemporâneo. Mas é, acima de tudo, e no meu entender, um livro que abre um caminho do exterior para o interior de cada leitor, assente numa máxima milenar: a importância fundamental de nos conhecermos a nós mesmos. Sem dúvida um texto inspirador, cujo efeito — desacelerar, parar, refletir, estar presente e em paz — se fará sentir muito para além das poucas horas que dedicamos à sua leitura. Talvez decidam, como me aconteceu a mim, mais de um mês depois de ter terminado o livro, fazer experiências e ver o que acontece quando nos mantemos 48 horas sem falar, sem ligar a televisão, o rádio ou o computador, sem acedermos à internet, com o telefone em “modo avião”, fechado dentro de uma gaveta. No meu caso, posso garantir-vos que não vejo a hora de voltar a fazê-lo e que apenas dois dias já não me bastarão…

Recomendo “Silêncio na era do ruído” a quem já percebeu que precisa de parar, de fazer uma ou muitas pausas, mas não sabe por onde começar. Recomendo-o, também, a quem precisa de se reencontrar, porque o silêncio é um meio precioso para nos ouvirmos a nós mesmos. O silêncio pode ser um primeiro passo para uma grande mudança. E este excelente livro, que se lê em pouco tempo, dá muitas e boas pistas para um primeiro passo. Coragem! Por outro lado, quem já conhece o poder e a riqueza do silêncio vai identificar-se com muito do que escreve Erling Kagge. Ao ler “Silêncio na era do ruído” sentir-se-á reconfortado e confirmará que está num dos bons caminhos possíveis para se viver melhor.

 

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